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Novo estudo mostra que relógios celulares de anti-envelhecimento podem ser usados para matar células cancerígenas

Um novo estudo liderado por Claus M. Azzalin, investigador principal do iMM e publicado hoje na prestigiosa revista científica Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS) mostra, pela primeira vez, que as estruturas anti-envelhecimento da célula – os telómeros – podem definir o limite de erros no DNA que uma célula cancerígena pode sustentar e acima do qual as células se não podem continuar a dividir e morrem. Estes resultados obtidos no âmbito de projetos financiados pela Fundação “la Caixa” e pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia, abrem novas possibilidades para as terapias contra o cancro.

Os telómeros são as extremidades dos cromossomas que vão sendo encurtadas ao longo da vida, a cada divisão celular, funcionando como um relógio do envelhecimento celular. A maioria das células cancerígenas é capaz de travar este relógio do envelhecimento através da ação da telomerase, uma molécula que neutraliza o encurtamento das extremidades dos cromossomas. Mas aproximadamente 10% dos tumores humanos são constituídos por um tipo de células cancerígenas – as células ALT – capazes de manter seus telómeros sem a ação da telomerase, sendo particularmente resistentes às quimioterapias convencionais. As células ALT são capazes de manter, a cada divisão celular, baixos níveis de erros no DNA nas regiões dos telómeros, e essa característica é necessária para que estes telómeros sejam alongados, permitindo assim que estas células se consigam dividir e multiplicar indefinidamente.

Agora, Bruno Silva e Claus M. Azzalin do iMM, descobriram que a fonte destes erros é TERRA, uma molécula de RNA produzida a partir dos telómeros. “Quando os níveis de TERRA aumentam, os erros no DNA dos telómeros também aumentam e isso torna-se tão pesado que mesmo uma célula cancerígena que costuma ser mais resistente, não se consegue mais multiplicar”, começa por explicar Bruno Silva, primeiro autor do estudo. “Em estudos anteriores, descobrimos que esta molécula – TERRA – tem um papel importante no processo de dano do DNA. Agora, descobrimos qual o mecanismo molecular que ocorre dentro destas células ALT”, acrescenta Claus M. Azzalin.

Enquanto nas células normais, as moléculas de TERRA estão presentes apenas em níveis muito baixos e sua função fisiológica ainda é amplamente desconhecida, nas células ALT as moléculas de TERRA são naturalmente mais abundantes. No entanto, quando a equipa de investigação usou ferramentas moleculares para aumentar ainda mais os níveis de TERRA dentro das células cancerígenas ALT, observaram uma acumulação muito grande de erros no DNA dos telómeros. “Para a célula cancerígena ALT, esta manipulação tem dois resultados: primeiro, a manutenção do telómero danificado é ativada e, segundo, para restaurar os erros, outros telómeros são usados e perdidos. A consequência para a célula cancerígena é por isso catastrófica! A célula não consegue reparar vários telómeros danificados e para de se dividir”, explica Bruno Silva.

Sobre a importância destes resultados, Claus M. Azzalin acrescenta: “Isto torna TERRA um alvo excepcionalmente versátil para terapia. Ao diminuir os seus níveis, podemos bloquear a manutenção dos telómeros, como mostramos anteriormente, enquanto que ao aumentar os níveis de TERRA, podemos aumentar os erros no DNA a níveis que não são sustentáveis mesmo para uma célula cancerígena, levando à morte dessa célula”. Esses resultados abrem uma nova janela para o desenvolvimento de protocolos terapêuticos para o tratamento de tumores com células ALT, baseados na manipulação da produção de TERRA.

Este trabalho foi realizado no iMM e foi financiado pelo programa Health & Research da Fundação “la Caixa”, pela European Molecular Biology Organization (EMBO) e pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT, Portugal).

Bruno Silva, Rajika Arora, and Claus M. Azzalin (2022) The Alternative Lengthening of Telomeres mechanism jeopardizes telomere integrity if not properly restricted. PNAS.