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Um novo estudo liderado pela Luísa Figueiredo, investigadora principal no Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes (iMM, Lisboa) e publicado hoje na revista científica Nature Microbiology* descobriu uma nova estratégia do organismo para controlar a infeção pelo parasita Trypanosoma brucei. O Trypanosoma é o parasita responsável pela doença do sono em humanos e pela nagana no gado, que continuam a ser um problema de saúde pública e um grande fardo económico na África Subsariana. A compreensão da resposta do organismo infetado durante a progressão da doença abre caminho para o desenvolvimento de novas estratégias de tratamento.

Após a picada por uma mosca tsé-tsé infetada, os parasitas colonizam os espaços intersticiais dos mamíferos hospedeiros, levando à morte se a infeção não for tratada. “Há alguns anos, o nosso laboratório descobriu que o parasita que causa a doença do sono, o Trypanosoma brucei, se acumula em números desproporcionalmente elevados no tecido adiposo. Achámos isto muito intrigante e direcionámos a nossa investigação para compreender se a colonização do tecido adiposo afeta a progressão da doença”, diz Luísa Figueiredo, líder do laboratório onde o estudo foi realizado. “A acumulação dos parasitas neste tecido é acompanhada de perda de peso. Agora, descobrimos que a perda de peso se deve em grande parte à perda de tecido adiposo por lipólise, um processo metabólico que quebra os triglicerídeos nas suas moléculas constituintes, incluindo ácidos gordos livres”, continua Luísa Figueiredo. A perda de tecido adiposo pode ocorrer em resposta a vários sinais diferentes. “Descobrimos que, neste caso, a lipólise é em grande parte induzida pela resposta imunitária do hospedeiro à infeção”, diz Henrique Machado, primeiro autor do estudo, explicando: “Infetámos ratinhos imunocomprometidos e ratinhos com alterações na lipólise e verificámos que, em ambos os casos, há menos perda de peso apesar de terem um maior número de parasitas”.

De seguida, os autores tentaram perceber se a lipólise contribui para a progressão da doença. “Vimos que a perda de tecido adiposo através da lipólise prolonga a vida dos ratinhos infetados. Isto, somado ao facto de a lipólise exercer um controlo sobre o número de parasitas, indica que esta resposta tem, de alguma forma, um efeito protetor. Curiosamente, descobrimos que este efeito protetor se deve à libertação de ácidos gordos livres, durante a lipólise, que são tóxicos para os parasitas e levam à sua morte”, explica Luísa Figueiredo: “É como se o corpo do hospedeiro se sacrificasse, ao perder gordura, para matar os parasitas”.

Estas descobertas podem abrir uma linha de tratamentos para a doença do sono e nagana completamente nova, focada na infeção no tecido adiposo, uma vez que a relevância deste tecido era, até à data, desconhecida.

*Henrique Machado, Peter Hofer, Rudolf Zechner, Terry K. Smith, Luísa M. Figueiredo. 2023. Adipocyte lipolysis protects the host against Trypanosoma brucei infection. Nature Microbiology. DOI: 10.1038/s41564-023-01496-7.

Este trabalho foi realizado no iMM em colaboração com a Universidade de Graz, Áustria, a BioTechMed-Graz, Áustria, e a Universidade de St Andrews, Reino Unido. Este trabalho foi financiado pelo Conselho Europeu para a Investigação, a Fundação Portuguesa para a Ciência e a Tecnologia e a Fundação Loius Jeantet.