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Os mamíferos têm pouca capacidade de recuperação após uma lesão na medula espinhal, o que pode resultar em paralisia. A principal razão para isso é a formação de uma cicatriz complexa associada à inflamação crónica que produz um microambiente celular que bloqueia a reparação do tecido. Agora, o grupo de investigação liderado por Leonor Saúde, investigadora principal no Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes (iMM) e Professora da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, demonstrou que a administração de fármacos dirigidos a componentes celulares específicos desta cicatriz, melhora a recuperação funcional após a lesão. Os resultados agora publicados na revista científica Cell Reports* estabelecem a base molecular para uma nova estratégia terapêutica promissora não apenas para lesões da medula espinhal, mas potencialmente para outros órgãos que carecem de competência regenerativa.

Este estudo foi realizado no iMM com a colaboração de investigadores do CEDOC NOVA Medical School e foi financiado pela Fundação “la Caixa” – CaixaResearch e a Fundação para a Ciência e Tecnologia (Portugal).

Leonor Saúde e o seu grupo estudam as lesões da medula espinhal usando dois modelos diferentes: o peixe-zebra, onde ocorre a recuperação da lesão medular e os mamíferos que têm uma recuperação deficitária. A cicatriz densa que se forma no local da lesão tem sido de particular interesse. Os cientistas observaram que em mamíferos, as células começam-se a acumular na periferia da lesão da medula espinhal. Mas estas células não são aleatórias: “Essas células são conhecidas como células senescentes. Têm características e marcadores específicos e são o que podemos chamar de “células zombies”, onde o crescimento e a divisão celular são interrompidos, mas onde o programa normal de morte celular não é ativado”, explica Leonor Saúde.

“Enquanto que no peixe-zebra a acumulação destas células na periferia da lesão é eliminada com o tempo, nos mamíferos essas células persistem e são componentes importantes da cicatriz densa que é observada. Como as células senescentes têm marcadores moleculares específicos, existem drogas específicas que podem ser testadas neste contexto”, diz Diogo Paramos-de-Carvalho, primeiro autor do estudo. “Com a administração de diferentes fármacos senolíticos, que visam especificamente estas células senescentes, observámos uma diminuição progressiva da acumulação das células, uma diminuição da extensão da cicatriz e menores níveis de inflamação devido à diminuição da secreção de fatores pró-fibróticos e pró-inflamatórios. As alterações observadas ao nível molecular estão na base da melhoria das funções locomotora, sensorial e da bexiga que também observámos”, explica Isaura Martins, também primeira autora do estudo.

“Embora ainda estejamos longe de curar as lesões da medula espinhal em humanos, estamos cada vez mais a conhecer melhor quais são as assinaturas moleculares dessas lesões e estes novos resultados promissores podem abrir novas estratégias terapêuticas que podem ser aplicadas não apenas às lesões da medula espinhal, mas em outras condições onde não existe uma competência regenerativa ”, afirma Leonor Saúde.

*Diogo Paramos-de-Carvalho*, Isaura Martins*, Ana Margarida Cristóvão, Ana Filipa Dias, Dalila Neves-Silva, Telmo Pereira, Diana Chapela, Ana Farinho, António Jacinto, Leonor Saúde (2021). Targeting senescent cells improves functional recovery after spinal cord injury. Cell Reports 36(1)109334.

Créditos: Diogo Paramos-de-Carvalho