A testagem de 2571 membros da comunidade académica da Universidade de Lisboa (ULisboa), mostrou a presença inequívoca de anticorpos específicos para o SARS-CoV-2 em apenas 38 indivíduos, o que corresponde a 1,5% da amostra. Assim 98,5% dos indivíduos analisados não entraram em contacto com o novo coronavírus, mantendo-se seronegativos do ponto de vista imunológico.
Em maio, a ULisboa iniciou um programa para testar a sua comunidade, como parte dos planos gerais do desconfinamento. Foram testadas 2571 pessoas, numa única campanha coordenada pela Faculdade de Medicina (FMUL), em estreita colaboração com a Reitoria, através do Estádio Universitário, na qual participaram todas as Escolas da ULisboa, tendo sido coletadas simultaneamente amostras nasofaríngeas e de sangue. As amostras nasofaríngeas foram analisadas em vários laboratórios, um esforço conjunto e que incluiu a Faculdade de Farmácia, o Instituto Superior Técnico, a Faculdade de Ciências e o Centro Académico de Medicina de Lisboa (CAML) (FMUL/Hospital Santa Maria/Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes (iMM)). A análise serológica das amostras de sangue, colhidas voluntariamente por alunos do 6º ano de Medicina supervisionados por internos da especialidade de Cardiologia do CHULN, foi realizada no iMM.
José Melo Cristino, Professor Catedrático de Microbiologia da FMUL e coordenador deste projeto explica os resultados: “Os 2571 funcionários e colaboradores da ULisboa testados nesta campanha são maioritariamente mulheres (66%) e têm idades compreendidas entre os 19 e 74 anos, tendo uma média de idades de 44 anos. Foram detetados 11 casos de infeção ativa (pelo teste de diagnóstico, RT-PCR, que revela a presença do vírus nas vias respiratórias superiores no momento do teste) e 38 casos de seropositividade (presença de anticorpos específicos para SARS-CoV-2 na amostra de sangue). Os casos de infeção ativa não revelaram sintomas, permanecendo assintomáticos.”
Marc Veldhoen, investigador principal no iMM, que coordenou os testes serológicos nesta campanha na ULisboa, com o apoio da Sociedade Francisco Manuel dos Santos, explica o processo: “como parte do consórcio Serology4COVID, que inclui 5 institutos de investigação de Lisboa e Oeiras*, desenvolvemos um método sensível e preciso para detetar se alguém contactou e reagiu ao vírus causador da COVID-19. O nosso sistema imunitário produz anticorpos como resposta a qualquer agente que não faça parte do nosso corpo, como é o caso deste vírus, e que são essenciais para a sua normal eliminação em cerca de 2 semanas.”
O ensaio padrão para a deteção destes anticorpos é o ensaio de ELISA. Para a deteção de anticorpos reativos contra o SARS-CoV-2, o método ELISA implementado pelo consórcio Serology4COVID, incluindo o iMM, é baseado no desenvolvido pelo laboratório de Florian Krammer, investigador do Mount Sinai, EUA (Stadlbauer et al., Current Protocols) e que recebeu autorização da FDA (Food and Drug Administration) em abril de 2020.
Das 2571 amostras analisadas neste censo, 62 (2,4%) deram um resultado positivo no teste inicial. Para reduzir o risco de falsos positivos, todas as amostras de sangue nas quais se detetou um sinal positivo foram reexaminadas usando as duas proteínas virais, RBD e Spike. Só quando o teste se confirmou positivo para ambas, foi o resultado final considerado um verdadeiro positivo, o que significa que a pessoa esteve infetada com o vírus e produziu anticorpos contra ele. Este processo de validação adicional restringiu as 62 amostras iniciais a apenas 38 confirmadas como verdadeiras positivas, o que representa 1,5% da população total analisada na ULisboa.
A baixa taxa de reatividade positiva contra o SARS-CoV-2 observado nesta comunidade específica pode estar associada ao encerramento antecipado dos espaços de trabalho da Universidade, a 13 de março e, por outro lado, a uma boa consciencialização de como as medidas de distanciamento social e de higiene são fundamentais para combater a disseminação desta doença.
Nota:
* O Serology4COVID é um consórcio de cinco institutos de investigação de Lisboa e Oeiras: iMM, Centro de Estudos de Doenças Crónicas da NMS|FCM (CEDOC), Instituto de Tecnologia Química e Biológica (ITQB NOVA), Instituto de Biologia Experimental e Tecnológica (iBET) e o Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC). As proteínas utilizadas no desenvolvimento dos testes serológicos utilizados neste censo foram produzidas no iBET.