ID: 66493969
 
Expresso
15-10-2016
País: Portugal
Âmbito: Informação Geral

Investigação tropical sem estratégia

Universidades querem planeamento e meios para competir à escala global

Virgílio Azevedo

A ideia foi lançada por António Rendas num artigo de opinião publicado recentemente no Expresso. O reitor da Universidade Nova de Lisboa (UNL) defendeu “um debate alargado sobre a investigação científica tropical”, uma área estratégica para Portugal, devido às fortes relações que tem com os países africanos e com o Brasil. E agora, em declarações ao Expresso, reconhece que “falta uma estratégia global nesta área, em que começamos a ter grupos de investigação fortes, mas não temos ainda instituições fortes”. E quando as instituições são fortes “podem trabalhar em rede” e ganhar massa crítica para competirem com outros centros de investigação à escala internacional.

“Nunca houve grande investimento em Portugal na cooperação científica com os países tropicais”, sublinha Paulo Ferrinho, diretor do Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT), que pertence à UNL. O interesse da UE nestes países também diminuiu “e só a recente vinda das doenças tropicais para outras regiões do mundo, incluindo possíveis focos europeus, levaram Bruxelas a prestar de novo atenção a esta área”. Com efeito, “houve um regresso da malária à Grécia e especula-se sobre a reintrodução da febre amarela na Europa”, diz o mesmo responsável.

Ministro promete soluções

António Cruz Serra, reitor da Universidade de Lisboa (UL), considera também que “o país precisa de ter uma estratégia global para a ciência tropical, fundos disponíveis para a financiar e equipas de investigação com massa crítica”. O Instituto de Investigação Científica Tropical, extinto pelo anterior governo, foi integrado na UL através do Instituto Superior de Agronomia (unidade de agricultura) e da Faculdade de Letras (unidade de história).

“É uma das áreas que queremos incluir no futuro Plano Nacional de Ciência e Tecnologia em 2017”, revela Manuel Heitor. O ministro da Ciência recorda também que no protocolo de cooperação científica e tecnológica assinado em maio com a Fundação Aga Khan, que envolve um financiamento de 10 milhões de euros assegurado por esta instituição, “o objetivo é estimular o apoio a novos projetos e redes de investigação entre Portugal, os PALOP e instituições da Rede Aga Khan”. Os projetos serão apoiados pela Fundação para a Ciência e Tecnologia, “através de concursos a lançar em 2017 que incluem o sector agrícola e a digitalização e acesso livre dos arquivos de ciência tropical”.

“Por vezes gasta-se muito dinheiro na ciência e não se discute estratégia nenhuma, os resultados desse investimento perdem-se”, diz Maria Mota, “mas o país precisa de saber o que quer ser daqui a dez anos na investigação das doenças infecciosas e na sua relação científica com o mundo tropical”.

A ciência tropical na UL desenvolve-se ainda no Instituto de Medicina Molecular (iMM), onde uma equipa liderada por Maria Mota, diretora-executiva do iMM, provou “que o parasita da malária tem capacidade para se adaptar ao ambiente, isto é, ao hospedeiro, e que é mais ou menos virulento conforme a carga calórica ou capacidade de o alimentar que esse hospedeiro tem”. Este é o projeto mais importante em curso no Maria Mota Lab, financiado pela bolsa de 1,5 milhões de euros do Conselho Europeu de Investigação que a investigadora ganhou em 2012. Outra equipa liderada por Miguel Prudêncio, com o apoio financeiro da Fundação Bill & Melinda Gates, procura uma vacina eficaz para uma doença que mata todos os anos quase um milhão de pessoas. E a doença do sono é estudada no laboratório dirigido por Luísa Figueiredo.

Não é fácil fazer um levantamento da ciência tropical feita em Portugal, porque a par dos centros de investigação que se dedicam exclusivamente a esta área (como o IHMT), há muitos outros em que esta é apenas uma das frentes da sua atividade, tal como no iMM. Na Universidade do Porto, por exemplo, entre os 19 grupos de pesquisa do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (CIBIO), há muitos projetos que envolvem os PALOP, outros países africanos (Mauritânia, África do Sul) e o Brasil.

Temas: Edulog/Universidades
Saúde/IMM - Instituto Medicina Molecular