Este site utiliza cookies. Ao utilizar este site está a consentir a sua utilização de acordo com a nossa Política de Cookies.

concordo
voltar

O músculo é conhecido por se regenerar através de um processo complexo que envolve várias etapas e depende de células estaminais. Agora, um novo estudo liderado por investigadores do Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes (iMM; Portugal) e da Universidade Pompeu Fabra (UPF Barcelona; Espanha) e publicado hoje na revista científica Science descreve um novo mecanismo de regeneração muscular após deteriorações fisiológicas que envolve o rearranjo dos núcleos das células musculares. Este mecanismo de proteção abre o caminho para uma compreensão mais ampla da regeneração muscular na fisiologia e na doença.

O tecido muscular esquelético, órgão responsável pela locomoção, é formado por células que possuem mais do que um núcleo, característica quase única no corpo humano. Apesar da plasticidade das células musculares, a sua contração pode ser acompanhada por danos nos músculos. William Roman, autor principal do estudo e investigador do iMM e da UPF Barcelona, explica: “Mesmo em condições fisiológicas, a regeneração é vital para o músculo suportar o stress mecânico da contração, que muitas vezes leva a danos celulares.” Embora a regeneração muscular tenha sido profundamente investigada nas últimas décadas, a maioria dos estudos centrou-se nos mecanismos que envolvem outros tipos de células, incluindo as células estaminais musculares, que são necessárias para a reparação de lesões extensas nos músculos.

“Neste estudo encontramos um mecanismo alternativo de regeneração que é autónomo das células musculares”, diz Pura Muñoz-Cánoves, líder do grupo na Universidade Pompeu Fabra e coordenadora do estudo. Os investigadores usaram diferentes modelos in vitro de lesão muscular e modelos de exercício em ratinhos e humanos para observar que, após uma lesão, os núcleos das células musculares são atraídos para o local da lesão, acelerando a reparação das unidades contráteis. Em seguida, a equipa dissecou o mecanismo molecular desta observação: “As nossas experiências com células musculares em laboratório mostraram que o movimento dos núcleos para os locais da lesão resulta na entrega local de moléculas de mRNA. Essas moléculas de mRNA são traduzidas em proteínas no local da lesão que atuam como blocos de construção para a reparação muscular”, explica William Roman. Sobre a importância destas descobertas, Pura Muñoz-Cánoves afirma: “Esta descoberta constitui um avanço importante na compreensão da biologia muscular, em condições normais, ditas fisiológicas, mas também nas disfunções musculares”.

Para além das implicações para a compreensão da biologia do músculo, este estudo também introduz conceitos mais gerais para a biologia celular, como o movimento de núcleos para locais de lesão. “Uma das coisas mais fascinantes nestas células é o movimento dos núcleos, os maiores organelos dentro da célula, durante o desenvolvimento, mas os motivos pelos quais os núcleos se movem são em grande parte desconhecidos. Agora, mostramos uma relevância funcional para este fenómeno na idade adulta durante a reparação e regeneração celular do músculo”, afirma Edgar R. Gomes, investigador principal do grupo do iMM, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa e co-coordenador do estudo.

O trabalho foi desenvolvido no iMM e UPF Barcelona em colaboração com a Universidade de Valência. Este estudo foi financiado pela Association Française contre les Myopathies, a European Molecular Biology Organisation, o Human Frontiers Science Program, o MINECO-Spain e o European Research Council.

William Roman, Helena Pinheiro, Mafalda R. Pimentel, Jessica Segalés, Luis M. Oliveira, Esther García-Domínguez, Mari Carmen Gómez-Cabrera, Antonio L. Serrano, Edgar R. Gomes, Pura Muñoz-Cánoves (2021). Muscle repair after physiological damage relies on nuclear migration for cellular reconstruction. Science 374(6565):355-359.